quarta-feira, 27 de abril de 2011

Os Belgas

Tinha medo deste mar mas foi ele que me viu nascer. Andávamos horas e horas quando a maré estava vazia, e assim chegávamos longe e estávamos fora todo o dia. O mais longe que fui não passou da praia dos Belgas, um lugar deserto, naquela altura. Uma piscina vazia perto da praia. Grandes conchas na areia, raramente pisada. Era como se chegássemos a um planeta distante, ou como se dobrássemos o Cabo da Boa Esperança. Sentávamo-nos exaustos, cheios de silêncio por todo o lado. Por essa altura a maré tinha subido e tapado o caminho de regresso. esperávamos horas que a maré baixasse. Um dia inteiro. Voltávamos com o por do sol. Um dia encontrámos um grande barco á vela que tinha encalhado na areia durante a noite. Era enorme e lembrava o príncipe que se tranformou num eucalipto à espera que uma mulher se apaixonasse por ele para que voltasse á vida e se transformasse de novo num homem. Mas claro que esse dia não chegou.  O barco branco lembrou-me o príncipe silencioso, à espera do impossível: ser salvo com um beijo de amor. Quem beija uma árvore que raramente fala? quem beija um barco com as velas rasgadas, mudo, enterrado na areia?  Um e outro perderam a esperança de serem resgatados.
Há coisas que não mudam. Vão assim pelo rio da vida abaixo.

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